26 julho 2008

A-B-A-Ç-A-I-A-D-O*

E o que resta sem sentido
Fico perdido, sem direção
Fico danado e nado o que for preciso

Em busca de um porto pro meu coração


Já tem bastante tempo que não se passa um dia sem que eu me pergunte "que faço da minha vida?". Isso até seria bom se eu não tivesse 30 anos e por conta deles, trocentos alarmes - emocionais, hormonais, afetivos, sociais, espirituais - apitando renitentemente. E eu nem sei dizer de onde vem tanta ansiedade, já que numa olhada panorâmica (e displicente, claro) parece estar tudo no lugar. Tenho até vergonha de ser tão reclamona... tanta gente vivendo uma vida cachorra e eu aqui, em constantes e inúteis crises existenciais. aff. Até quando, jesuiscristo?

Anubliado clareou
Chão barreado não esconde a cor
Nas lembranças que eu trago meu perdão e meu rancor

Vivo repetindo pras pessoas que nem o vento consegue ajudar barcos que não sabem pra onde vão e só agora sinto o peso de cada palavra. É confuso, não me sinto perdida, mas tecnicamente, quando andamos léguas e não chegamos a lugar algum é pq nos falta direção, né? (percebam que a criatura NÃO se sente perdida...) Poizé, não me sinto. Na verdade não sinto nada
. ( socorro, alguém me dê um coração que esse já não bate nem apanha...) Nada, fora o mui familiar senso de inadequação. rs

Abaçaiado se irritou
No outro lado fica quem não atravessou
Se hoje abaçaiado canta

É porque ontem já chorou


Depois de anoooooos numa empatia franciscana, de uma civilidade que beira a idiotice, eis que ando tão demasiado humana que nem me reconheço. (Se há algum mérito nisso, meus novos erros tem me feito bem mais tolerante com os erros alheios. hohoho)

* Abaçaiado e outras pérolas estão n´O Segundo Ato d´O Teatro Mágico. BAIXEM. Se quiserem o torrent, eu mando, só pedir!

18 julho 2008

SOBRE A FUNDAMENTAÇÃO FILOSÓFICA DOS MEUS MELHORES DEFEITOS

[republicar]

Já confessei aqui o (mau)hábito de comentar as coisas que leio. Desta vez, pra poupar o povo dos meus achismos sobre Nietzsche, resolvi só escrever:

Do meu ar blasé:
"Um espiríto livre... assim se vive, não mais nos grilhões de amor e ódio, sem SIM, sem NÃO,voluntariamente próximo, voluntariamente longe, de preferência escapando, evitando, esvoaçando, outra vez além, novamente para o alto... "

Da minha invencível credulidade:
"De fato, uma fé cega na bondade da natureza humana, uma espécie de pudor frente à nudez da alma podem realmente ser mais desejáveis para a felicidade geral do homem... e talvez a crença no bem tenha tornado os homens melhores, na medida em que os tornou menos desconfiados..."

Das reincidentes crises existenciais:
"É mais difícil afirmar a personalidade sem hesitação e sem obscuridade do que dela se liberar...além disso, requer muito mais espírito e reflexão."

Dos extremos da minha sinceridade:
"A mentira exige invenção, dissimulação e memória... quem conta uma mentira raramente nota o fardo que assume, pois para sustentar uma mentira ele tem que inventar outras vinte."

Da incompetência emocional:
"Por que superestimamos o amor em detrimento da justiça e dizemos dele as coisas mais belas, como se fosse algo muito superior a ela? Não será ele visivelmente mais estúpido?"

Dos subterfúgios do vacabulário:
"Escritores que não sabem dar clareza as suas idéias preferirão os termos superlativos mais fortes: o que produz o efeito semelhante à luz de artoches em emaranhados caminhos da floresta."

Da tolerância sorridente (e pedante tsc):
"Muitas ações são chamadas de más e são apenas estúpidas, porque o grau de inteligência que se decidiu por elas era bastante baixo."

Dos gostos discutíveis:
"A mais nobre espécie de beleza é aquela que não arrebata de vez... mas que lentamente se infiltra, a que levamos conosco quase sem perceber."

Da febre de sentir:
"Quem já escreveu e sente em si a paixão de escrever quase que só aprende, de tudo o que faz e vive, aquilo que é literalmente comunicável."

Da indolência habitual:
"Quando se é alguma coisa não é preciso fazer nada - e costuma-se fazer muito. Acima do homem produtivo há uma espécie mais elevada."

[/republicar]

N.A.: um leitor mais atento sugeriu na época um outro tópico, "textos truncados". Segue íntegra do comment:

Anônimo
20/10/06 13:53

Eu já te leio há bastante tempo. Não comento sei lá pq, fico sem jeito... sou naturalmente invasivo. Mas hj que falou do Nietzsche não tem como. rsrs Entre os seus defeitos (que eu acho uma delícia) vc esqueceu de citar os "textos truncados", a respeito dos quais ele tb falou no livro:"o vago é necessário pra tornar distinto"

Termino com um recorte que tá me queimando por dentro:
- Odeio quem me rouba a solidão sem em troca me oferecer verdadeiramente companhia, disse Nietzche.
- Como assim, não oferecer companhia?
- Por não prezarem as coisas que prezo! Às vezes enxergo tão profudamente a vida que, de repente, olho ao redor e vejo que ninguém me acompanhou e que meu único companheiro é o tempo.
bjs, MAX

13 julho 2008

EU HOJE JOGUEI TANTA COISA FORA...

Ontem andei revirando minhas velharias. Incrível minha capacidade pra nostalgia: cartas, fotografias, bilhetinhos, guardanapos do Bob´s com tels (que eram só tels., fixos. Nada de celulares ou Nextell rs), passagens rodoviárias (crê que eu guardei o bilhete do Barra Mansa X Campo Grande que me levou para UFRRJ pela 1ª vez?), poemas, músicas e alguns textos que – eu nem me lembrava – se salvaram do impulso incendiário que pariu este blog... bem, até ai uma faxina no guarda roupa e na alma e só. Agora, minha criança, um exorcismo quase foi depois de 15 anos finalmente dar cabo num certo frasco de perfume, dado por um certo ser que não merece exumação, que apenasmente por estar lá me olhando cada vez que abria a porta, me remetia aos tempos idos e nem-tão-saudosos-assim, onde o amor era medo e eu achava melhor acordar sozinha...


Mas pq estou te dizendo essas coisas, retrocedendo à modernidade e te enviando uma carta ao invés de um scrap ou depoimento? Oras, pq talvez isso fique meio grande. rs (no que há de me perdoar, que esses surtos são piegas mas amigas são sempre perdoáveis!) Mas tb pq acho que quero retomar meu (bom) hábito de escrever às pessoas... andei muito tp ensimesmada, ocupada com minhas próprias novidades e me dou conta que pouco ou nada sei de meus amados.


Sobre isso, próprias novidades, não só o look é novo! Embora ainda seja a mesma e viva como os nossos pais, é com incontido orgulho que constato que sou outra: outros olhares, outras crenças (menos ortodoxas talvez mas igualmente apaixonadas!), outros gostos... a mesma curiosidade de sempre. O mesmo senso de inadequação, a mesmíssima instabilidade e, felizmente, isso já não me assusta mais.


Pra estar um cadim mais perto do que mereço/preciso, depois de peregrinar por terras tão áridas e distantes que quase nem reconheço como propriedade minha, só me faltava um amor daqueles quentinhos, de manhã cedo, com gosto de hortelã e cheiro de mato molhado... enquanto esse não chega, tenho vivido algo menos (beeeem menos eu diria!) ordinário. Cinestesicamente delicioso e moralmente questionável. hohoho Me fez mais viva, me faz mais corajosa e me fará – certeza – me fará mais gente. Amém. rs Terapeuta diz e eu quaaaaaase concordo, que ele está me ensinando a lidar com a finitude das coisas, que eu sempre acabo com elas antes do final pra não precisar lamentar a perda. Que nobre jeito de desperdiçar a vida, não? Nobre e tristíssimo. Covarde, maniqueísta e em vias de superação \o/


Estamos na fase do “quem vai dizer tchau?”, dói fininho às vezes. Mas como ninguém foi embora a-i-n-d-a, manda a verdade que se diga que estamos mesmo é em fase nenhuma, mortos de pena pelo derradeiro inevitável, procurando um meio termo razoável entre o que é bom e o que é correto. Cá comigo, secretamente, alimento a vaga esperança de um dia acordar absolutamente assexuada em relação a ele e acabarmos bons e castos amigos. Prematuramente meio brochas. Divertidos, serenos, gratos e cúmplices ad eternun. O top da urbanidade, convenhamos.


Fico por aqui te desejando, pra hj e pra sempre, amor pra recomeçar.

Conte-me de vc, se quiser. Do contrário, recebe meu carinho e abraço sufocante.
bjs meus, te amo pra sempre.


N.A.: 1ª cartinha que segue com destinatário específico e real. É que pretendo retomar o bom hábito de escrever às pessoas. Minha reação contra toda essa coisa monossilábica e impessoal que se tornou a comunicação, subproduto da capetice que é o orkut... mr Postman right tech!!

06 julho 2008

CAIO FODÁSTICO ABREU

Tenho alguns livros desse homem e ainda não sei dizer se gosto ou não. Aliás, saber eu sei:

A-m-o. Amo o jeito dele de comer a última palavra da frase; amo esse estilo que me confunde e se não prestar um cadim de atenção me perco entre o que é dito, pensado ou sentido pelas personagens; amo os lapsos na cronologia dos fatos; amo as frases cruas e a (in?)previsibilidade emocional, que me remete ao caos cinestésico no qual estamos todos imersos, afinal; amo a fragilidade latente, que só vira agressão pela mais absoluta canhestrice.

O-d-e-i-o. Odeio aquele turbilhão descritivo que me torna incapaz de imaginar o que ele quis que fosse importante nas frases; odeio quando ele faz a loucura e a sordidez humanas nos parecerem mais familiares; odeio tudo ser tão factual, consumado, irretorquível, tristíssimo... odeio tudo estar a um passo da histeria e ainda assim ser perfeitamente compreensível. (Na verdade eu acho que odeio mesmo é que isso pode ser um indício da minha histeria hohoho!)

E é isso. Odeio-te, meu amor! rs

(mudando de assunto, mas nem tanto, alguém concorda comigo que escolheram mal a adaptação de Caio F. pros cinemas? Onde Andará Dulce Veiga tá me parecendo tão comercial qto Cazuza, O Tempo Não Pára. tsc Pra fazer jus ao talento do homem, deviam filmar Pela Noite, dai teríamos o nosso próprio Segredo de Brokeback Mountain, que perderia na fotografia mas seria um escândalo de roteiro e interpretações!)


N.A.: e pr'os que ainda não se deram conta, esse blog é um diarinho. E já que acordei numa mulherzice insuportável - de novo - termino falando do meu coração, pinçando as frases dele (as mais desarmadas, e por isso verdadeiras e por isso², belíssimas):

Nave, ninho, poço, mata, luz, abismo, plástico, metal, espinho, gota, pedra, lata... passei o dia pensando — coração meu, meu coração. Pensei e pensei tanto que deixou de significar uma forma, um órgão, uma coisa. Ficou só som-cor, ação — repetido, invertido — ação, cor — sem sentido — couro, ação e não. Quis vê-lo, escapava. Batia e rebatia, escondido no peito. Então fechei os olhos, viajei. E como quem gira um caleidoscópio, vi:

Meu coração é um sapo rajado, viscoso e cansado, à espera do beijo prometido capaz de transformá-lo em príncipe.

Meu coração é um álbum de retratos tão antigos que suas faces mal se adivinham.

Meu coração é o mendigo mais faminto da rua mais miserável.

Meu coração é um ideograma desenhado a tinta lavável em papel de seda onde caiu uma gota d’água.

Meu coração não tem forma, apenas som.

Meu coração é um entardecer de verão, numa cidadezinha à beira-mar.

Meu coração é um anjo de pedra com a asa quebrada.

Meu coração é um bar de uma única mesa, debruçado sobre a qual um único bêbado bebe um único copo de bourbon, contemplado por um único garçom. Ao fundo, Tom Waits geme um único verso arranhado. Rouco, louco.

Meu coração é um sorvete colorido de todas as cores, é saboroso de todos os sabores. Quem dele provar, será feliz para sempre.

Meu coração é um deserto nuclear varrido por ventos radiativos.

Meu coração é o laboratório de um cientista louco varrido, criando sem parar Frankensteins monstruosos que sempre acabam por destruir tudo.

Meu coração é uma velha carpideira portuguesa, coberta de preto, cantando um fado lento e cheia de gemidos — ai de mim! ai, ai de mim!

Meu coração é um poço de mel, no centro de um jardim encantado, alimentando beija-flores que, depois de prová-lo, transformam-se magicamente em cavalos brancos alados que voam para longe, em direção à estrela Vega. Levam junto quem me ama, me levam junto também.

Recortes de "Na Terra do Coração", em Pequenas Epifanias.


ET: A quem interessar possa, eu ando muito precisada desse livro ai ó, o "Pequenas Epifanias"... "Cartas" tb faria uma criança feliz, muito feliz eu diria. rs