10 dezembro 2006

queridos, hj é aniversário de Clarice Lispector. Segue minha singela homenagem a uma mulher simplesmente atemporal, pra ficar num único adjetivo.
(nem conto o trabalho que deu escolher um texto pra postar. Esse aki me parece exato, pelo menos me cabe inteirinho na alma.)


AS TRÊS EXPERIÊNCIAS
Há três coisas para as quais eu nasci e para as quais eu dou a minha vida. Nasci para amar os outros, nasci para escrever, e nasci para criar meus filhos. “O amar os outros” é tão vasto que inclui até o perdão para mim mesma com o que sobra. As três coisas são tão importantes que minha vida é curta para tanto. Tenho que me apressar, o tempo urge. Não posso perder um minuto do tempo que faz minha vida. Amar os outros é a única salvação individual que conheço: ninguém estará perdido se der amor e às vezes receber amor em troca.

E nasci para escrever. A palavra é meu domínio sobre o mundo. Eu tive desde a infância várias vocações que me chamavam ardentemente. Uma das vocações era escrever. E não sei por que, foi esta que eu segui. Talvez porque para outras vocações eu precisaria de um longo aprendizado, enquanto que para escrever o aprendizado é a própria vida se vivendo em nós e ao redor de nós. É que não sei estudar. E, para escrever, o único estudo é mesmo escrever. Adestrei-me desde os sete anos de idade para que um dia eu tivesse a língua em meu poder. E no entanto cada vez que eu vou escrever, é como se fosse a primeira vez. Cada livro meu é uma estréia penosa e feliz. Essa capacidade de me renovar toda à medida que o tempo passa é o que eu chamo de viver e escrever.

Quanto aos meus filhos, o nascimento deles não foi casual. Eu quis ser mãe. Meus dois filhos foram gerados voluntariamente. Os dois meninos estão aqui, ao meu lado. Eu me orgulho deles, eu me renovo neles, eu acompanho seus sofrimentos e angústias, eu lhes dou o que é possível dar. Se eu não fosse mãe, seria sozinha no mundo. Mas tenho uma descendência, e para eles no futuro eu preparo meu nome dia a dia. Sei que um dia abrirão as asas para o vôo necessário, e eu ficarei sozinha: é fatal, porque a gente não cria os filhos para a gente, nós os criamos para eles mesmos. Quando eu ficar sozinha, estarei seguindo o destino de todas as mulheres.

Sempre me restará amar. Escrever é alguma coisa extremamente forte mas que pode me trair e me abandonar: posso um dia sentir que já escrevi o que é meu lote neste mundo e que eu devo aprender também a parar. Em escrever eu não tenho nenhuma garantia. Ao passo que amar eu posso até a hora de morrer. Amar não acaba. É como se o mundo estivesse a minha espera. E eu vou ao encontro do que me espera.

12 comentários:

Anônimo disse...

Clara que lindo!
Sem mais palavras, só para deixar registrado o comentário mesmo e um beijo de carinho.
Ah, se for no blog do Lino, o link tá na minha página, pode ver uma relação de quem postou sobre a Clarice, acho que você vai pirar.
Um grande beijo!

Anônimo disse...

Puxa, acabei de vir do Lino, vocês tiveram o mesmo bom gosto.
Beijocas!

Anônimo disse...

vi em alguns blogs e vi teu convite no orkut, pergunta se o Blogger deixa eu postar??????

se der ainda faço hoje, ok? porque AMO essa mulher, a quem toda e qualquer homenagem será sempre pouca.

beijos, querida

Anônimo disse...

A profundidade das sensações dela é que me encantam.

Anônimo disse...

A profundidade das sensações dela é que me encantam.

Vera F. disse...

Vc e o Lino escolheram o mesmo texto. Mas cada vez que leio, capto alguma coisa diferente. Tbm participei da blogagem coletiva.

Bjos.

Livros & Literatura disse...

Passo para conhecer o seu blog e a homenagem a Clarice. O texto que você escolheu é belíssimo. A blogagem coletiva é uma experiência estimulante e interessante. Parabéns!
Um abraço, Marcela Vieira.

"Os fatos são sonoros. O que importa são os silêncios por trás deles."

(Clarice Lispector)

Mônica disse...

UHUUUUUUUUU...consegui! a trancos e barrancos, mas postei....

Sem máscaras disse...

Claraa..nunca + deixei recado mas continuo lendo e me emocionando com vc...sensibilidade afloradíssima ultimamente..tsi tsi..bjussss

Anônimo disse...

Muito emocionante. Lispector é o que há de melhor. Beijos.
Ah, sobre minhas resoluçoes do post: acho que nunca vou descobrir mesmo. rs. bjos.

Jana disse...

Clarice é perfeita, lê nossa alma não?

Beijos

Anônimo disse...

Clara:
Uma bela escolha do texto, que mostra um pouco de Clarice.
Estou passando para agradecer a participação.
Muito obrigado.