27 abril 2008

SOBRE O INVENTÁRIO DO IRREMEDIÁVEL*

É que há alguns meses tenho voltado a Neverland só pra dormir: Peter Pan está de férias e ando brincando de gente grande. Não que eu seja infantil, não mesmo, mas é que à minha pessoa faltavam alguns aspectos mui familiares às outras colegas balzaquianas rs

Dai que entre pequenas e grandes constatações, entre surtos e epifanias, com os dez dedos lambuzados em situações cinestesicamente deliciosas (e moralmente questionáveis tsc) eis que me dou conta de que meu auto domínio está descalibrado. E isso é irremediável.

Meu constante "não saber" tb é irremediável e as respostas que colecionei com algum orgulho durante anos a fio são meias verdades sem efeito placebo. Mas, manda a verdade que se diga, isso chega a ser um alívio. Na rotina de me ser tanto compromisso como a coerência e a precisão deve ter me envelhecido séculos. rs

É irremediável manter um emprego. A maldição é bi-milenar: comerás o pão com o suor do teu rosto. Que tal se render? Muito feio alguém da minha idade impunemente desocupado. tsc

É lamentavelmente irremediável coisas e pessoas que gravitam ao meu redor não serem uma extensão do meu domínio, mas me des-ocupar do que não é da minha conta tem me dado mais tempo pra prestar atenção em mim, nas minhas precisâncias. O que me libera do arquétipo de carpinteiro do universo. \o/ E é igualmente irremediável as pessoas terem ritmos diferentes dos meus e a única constante nas histórias ser o desencontro.

É tristemente irremediável a gente só se dar conta do valor das coisas depois que perde. A parte legal é que qdo alguém TE perde, é pra sempre, sem choro nem vela. Nem fantasmas. (bem, alguns fantasmas, vá lá... de toda forma, há sentimento mais consolador do que a inocência? rs)

...

(Já estou há quase 15 min olhando pra essa tela e não sei como terminar...rs)

Enton... inventário supõe espólio, que supõe morte... hum... talvez essa falta de leveza nos meus rabiscos seja uma espécie de luto... é isso: uma das muitas que me habitam está agonizando e nós outras amotinadas estamos em vigília... talvez essa muerte
chiquita cumpra a contento o rito de passagem que todas as outras mortes as quais sobrevivemos nessa vida deveriam seguir: fim de uma coisa, início de outras. Simples e cíclico como deve ser.

(Digam lá se eu não seria uma boa terapeuta? Eu acho que sim!!! Acho msm.)

* 1º livro publicado de Caio Fernando Abreu. Re-editado 25 anos depois e re-batizado: Inventário do Ir-remediável. Passando da fatalidade daquele irremediável (algo melancólico e sem saída!) para ir-remediável, (um trajeto que pode ser consertado?) sic!

Roubei a idéia completa: tanto o título qto o sentido... só espero que meus irremediáveis não comemorem bodas de prata me gastando a beleza. (amém!)

8 comentários:

Jana disse...

Senhor do Céu!! VOu ter que ler tudo de novo pra entender as entrelinhas, se bem que já sei quase tudo, pq esses surtos de ser te descrevem não?

É tem coisas irremediáveis, mas agora, se o lance do emprego manter-se for este atual, quem morre sou eu ok?

Outra coisa, eu li esses dias num comentario que me deixaram "eu ando cansada de ser eu". eu acho que se enquadra tão bem...

beijos

Camilinha disse...

Tanto o post anterior como este são ótimos... Um é um testamento em vida, o outro uma vida em um testamento...

adorei...

beijos daqui...

eurídice disse...

tri-amada,

tu sempre escreves bem. mas acontece que às vezes tu escreves tão bem, mas tão bem, que chego a me perguntar se algum dia já tive mesmo a honra de sentar ao teu lado, de carne e osso... e seguem nossas almas sensíveis e nossos corações dom-quixotescos inventariando o irremediável.
beijos meus, saudades de ipanema e um brinde ao delicado da vida com vinho chileno.
lindo dia do trabalho (para vc que se rendeu à imprescindibilidade dele)!!!!
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"... Na rotina de me ser tanto compromisso como a coerência e a precisão deve ter me envelhecido séculos..." - queria ter escrito isso - te digo!!!!!!

Anônimo disse...

Se o que é irremediável, por definição, não tem remédio, tomemos a vacina qdo der! Para os outros casos, tenhamos a sensatez de esquecê-los por alguns momentos e aproveitar o delicado da vida antes que nos acometamos do mal de não ter vivido pensando única e exclusivamente no irremediável (por oras neon...)!

Jana disse...

sabe, tava te lendo de novo, e cheguei a conclusão, que nunca, nunca, nunca chegarei a escrever como vc...

"Meu constante "não saber" tb é irremediável e as respostas que colecionei com algum orgulho durante anos a fio são meias verdades sem efeito placebo."

Senhor né!!! Perfeito!

Beijos

Unknown disse...

não sei se uma boa terapeuta
mas com certeza uma ótima escrevedora de sentimentos vc já é

Anônimo disse...

Confesso que o que mais me chamou atenção para ler o seu post foi exatamente o título do livro do Caio, levando em conta que o Caio Fernando Abreu é um dos meus escritores preferidos .. =)
Concordo com o pessoal aí de cima... tu escreves muito bem, menina! Adorei o seu blog e os seus devaneios aí (devaneios, digo no bom sentido, ok?)

Abraços.

Grazi disse...

Mudar o que pode ser mudado dói, mas também é irremediável.
Aceitar o que não podemos mudar dói mais ainda, e também é irremediável.
Foi o que senti lendo seu texto...
Cada frase representa conflito interior e eu entendo porque (juro) já passei por cada uma dessas inquietações: as verdades desconstruídas, o emprego maldito e mantido, o deixar as pessoas livres (e perdê-las muitas vezes) etc.
Voltarei mais vezes!